domingo, março 26, 2006

Sete Cores

até que um dia, descobri que gostavas de azul e, com tintas e pincel fiz céu imaculado no quadro de parede que emoldurei em dourado pra lembrar pros teus futuros nosso amor de geração passado;

Mas foi decerto que nesta tua euforia, me disseste de cara vazia, que não gostavas de um céu sem nuvens, mas de um nodoado em branco azulado, em póvoas de carmim, com terreno verde escuro, de plantas de alecrim;

Então jorrei das tintas os milagres que devia a pintar a terra tua, pra que se enquadrasse na moldura todo desejo teu guardado e me disseste então a falta que te fazia um sol amarelado;

Logo então, já de pincéis guardados, retomei o cavalete e a paleta de mistura, pra pintar a formosura de um sol brilhante e farto e neste exato momento entraste no recinto de meus tormentos, a falar de um crepúsculo alaranjado;

E se teus sonhos eram todos coloridos, pintei teus olhos bandidos no fundo do meu retrato e ali jazia a obra, que terminada agora, lhe faria ulular;

Porém da tua face interrogativa, fiz partir minha premissa que do fim tu não gostaste;

Então rasguei a peça da figura, misturando as cores sujas num enorme arco íris. Tu então analisaste fundo a fundo minha peça e sorriste, como quem gostasse da obra de arte.

quinta-feira, março 23, 2006

O beijo

talvez fosse pompa de minha natureza, deveras espalhafatosa e estouvada, deixar entressair dos lábios muitas quantas palavras me vêm ao pensamento, que como um tufão me afoga; mas a gente leva freio de outra boca, tal qual um beijo de palavras que nos cala toda. E ficamos em silêncio, entrelínguas e saliva: essa troca mútua dos calares...

quarta-feira, março 22, 2006

O jeito Mulher de escrever

de vez em quando eu queria pensar como uma mulher ; não posso dizer que não sinto como uma. Muitas vezes me deparo com uma alma feminina por detrás deste marcelo racional das contas de matemática. Gostaria de pensar como uma mulher, não daquelas novas, de vinte e pouquinhos, ainda inseguras, fracas...frágeis; mas de uns cinqüenta: fortes, seguras, ainda frágeis, mas uma fragilidade toda imposta, com certo charme, vigor. Uma vez vi o Chico Buarque falando sobre o vislumbro que tinha com relação ao jeito fascinante do feminino, uma coisa tão sincera, que era possível ver aquele brilho nos olhinhos azuis dele: os gestos, a forma em que se expunha tal sentença...era como se chico fosse uma mulher tão apaixonada que neste momento senti certa inveja do pensamento dele. O jeito de rir, de falar sobre carros, beleza...isso tudo porque li uma crônica da Danuza Leão e fiquei encantado com o jeito mulher de escrever...

segunda-feira, março 20, 2006

Prostituição a 1,99!

Quando eu abri o jornal, que imprimia em manchas garrafais o título deste post, achei que fosse mais um daqueles planos malucos da governadora Rosinha:

- Pronto! Putas a um real!

No caso, dois reais né. Mas o fato é que falava de prostituição infantil e não importa como a gente pensa, acaba meio chocado com uma visão destas. O grande problema é que aí residem duas [ou mais?] vertentes: ser puta[o] e ser menor. Não fossem as péssimas condições dadas aos nossos cidadãos, ainda temos que nos torturar vendo menininhas se vendendo por tão baratinho. Afinal, como corpo é coisa individual, vender é uma opção [talvez até imposição...], mas a este preço?! Concordo com veemência que a prostituição infantil deveria ser abolida, mas enquanto existir que haja pelo menos uma legalização do treco, garantindo um salariozinho descente. Porque o povo vive com isso de tabu pra lá, tabu pra cá e acaba caindo num vão sem respostas. Não existe isso de colocar impresso no jornal

"Vamos acabar com a prostituição infantil"

e achar que no dia seginte, como um decreto, não haverá mais nada e tudo residirá na paz. O jeito é adensar, pesquisar por quê existe esse tipo de ação por parte das menores e tentar suprir essa base que as faz tão tênues.

sábado, março 18, 2006

Superstição


Vai, moleque!
Enxuga-te as lágrimas
com as costas da mão;
dá-te finalmente trégua
desse sonho dantesco
e pára de te basear
em hieráticas previsões.
Não digas que desta água
não beberás;
que um dia,
bem o sabes,
a casa cai
e a poesia,
sem pilastra, sem apoio,
desmorona.
E tu sem ela,
és como desabrigo,
como fratura exposta.

Vai, moleque,
que o mundo não gira
ao redor de ti
e nem por ti
faz sol ou chuva,
e nem por ti
se move ou dança.
O mundo é por ele só
e assim deverias...

Vai, moleque!
Enxuga-te as lágrimas
com as costas da mão;
dá-te finalmente trégua
desse sonho dantesco
e pára de te basear
em hieráticas previsões.
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Teve palestra do Gullar na UFRJ, muito legal. Ele como sempre, por demais engraçado, mas não deu pra entregar "Eu, como tu" pra ele. Fica pra próxima.

segunda-feira, março 13, 2006

Mãos vazias e coração cheio

Neste último domingo fui à praia. Andei, andei. Transeunte invisível meio ao calçadão lotado e aquele tropel de gente que só se esconde o ruído porque se está com fones e uma música que toca alto, ensurdecedora. Nem importa. Assim me distancio, assim "distanto". Fiquei fazendo barulho com a boca, cantando e batucando no banco. Uma senhora sorriu pra mim quando eu assobiava o "andar com fé"; se gostava não se sabe, sorriu apenas. E olhava o mar se quebrando no chão de areia, revolto em suas violentas ondas de ressaca: a maré tava alta, surfistas muitos...de algures. Fui à feira hippie e comprei um apito de maracatu; por tempos queria um daquele. Foi bom. De noite conheci gente nova e no final, voltei pra casa de mãos abanando e de coração cheio.

domingo, março 12, 2006

Comadre Florzinha - Grande Poder, para fins musicais

O nosso deus corrige o mundo
pelo seu dominamento sei o que a terra gira
com o seu grande poder
grande poder com o seu grande poder.

a terra deu, a terra dá, a terra cria
homem a terra cria, a terra deu a terra há
a terra voga a terra dá o que tirar
a terra acaba com toda má alegria
a terra acaba com o inseto que a terra cria
nascendo em cima da terra nessa terra há de viver
vivendo na terra que essa terra há de comer
tudo que vive nessa terra
pra essa terra é alimento
deus corrige o mundo pelo seu dominamento
a terra gira com o seu grande poder
grande poder, com o seu grande poder
o nosso deus corrige o mundo...

porque no céu a gente vê uma estrelinha
aquela estrela nasce e se põe as 6 horas
quando é de manhã aquela estrela vai embora
tem uma maior e tem outra mais miudinha
tem uma acesa e outra mais apagadinha
seis horas da noite é que pega a aparecer
quando é de manhãzinha ela torna a se esconder
só de noite ela brilha em cima do firmamento
porque deus corrige o mundo pelo seu dominamento
a terra gira com o seu grande poder
grande poder, com o seu grande poder
o nosso deus corrige o mundo pelo seu dominamento...

o homem aplanta um rebolinho de maniva
aquela maniva com dez dias tá inchada
começa a nascer aquela folha orvalhada
ali vai se criando aquela obra positiva
muito esverdeada, muito linda e muito viva
embaixo cria uma batata que engorda e faz crescer
aquilo dá farinha pra todo mundo comer
e para todas as criaturas vai servir de alimento
deus corrige o mundo pelo seu dominamento
a terra gira com o seu grande poder
grande poder, com o seu grande poder.

sábado, março 11, 2006

A falta de explicação nas coisas

É que quando se é Matemático, busca-se razão nas coisas: controle é algo essencial. É um vício do pensamento tentar racionalizar sempre! E pra cada coisa que aparece, sentimento, desilusão amorosa, há uma explicação, mesmo que sofismada. Eu queria entender porquê te amo, mas passo o dia inventando razões pro teu desprezo; cogito outras hipóteses: verdades múltiplas. E como bom matemático, demonstro; parto de um argumento falso, enfim, posso crer que cheguei ao verdadeiro. Porque sou matemático demais no que amo e sigo buscando razões pra isso, sem aceitar o fato de que na vida, simplesmente algumas coisas não se explicam.

domingo, março 05, 2006

Tudo que não fui antes de ser...

Eu tenho inveja deles que sabem o que fazem e são tudo aquilo que escolheram. Enquanto eu me esforço pra continuar dando razão à minha metamorfose ambulante. E no meu choro procuro expressar tudo aquilo que não. Porque sinto e lamento a música e tudo aquilo que não fui, antes mesmo de ser...

sábado, março 04, 2006

Masturbação

...e foi que, neste dia, nu com a mão em exercício de masturbação, percebi que aquilo não só era um ato solitário mas um ato de amor, onde penetrava apenas quem amo num plano aquém. Por muitos pensariam que se tratasse de algo obsceno a figura de meu desejo vinculada ao ato de sexo-unitário. Mas estávamos ali. Carne, força e pensamento, que tornava o eu-só uma célula, imultiplicável. Contentado! Porque o tinha em impulsos nervosos, o manto imaculado que o vento carrega nas nuvens em branco, e passa como quem não quisesse chamar atenção, mas faz barulho de uivo, e não se percebe; pusilânime quem se encontra aqui, com mãos atadas ao sexo, esperando que a memória estugue o tempo pra sentir o leve e afoito gozo, que tem sido pra mim, a coisa mais insossa, mais vazia, só e unicamente estimulado, sinceramente triste por não haver duplicidade. E a falta de libido repousa como parasita indolor, sopita a fonte que me deixa de pé ainda, com mãos agora longe do sexo, porque não tenho mais prazer. E você está longe, sem nunca entender o meu ato de amor.